
Diante da decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de aplicar uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros, o governo brasileiro avalia medidas de retaliação focadas em propriedade intelectual. A medida estadunidense deve entrar em vigor em 1º de agosto e foi comunicada por Trump em uma “carta aberta” publicada nas redes sociais na última quarta-feira (9).
Entre as medidas consideradas pelo governo brasileiro estão análises sobre a propriedade intelectual e a quebra de patentes como as principais ferramentas para uma resposta proporcional.
Especialistas afirmam que essa estratégia poderia impactar diretamente o setor produtivo dos EUA sem gerar inflação no Brasil, ao contrário de tarifas sobre alimentos, por exemplo. No entanto, há riscos, como insegurança jurídica e possível fuga de investimentos estrangeiros.
O que é propriedade intelectual?
A propriedade intelectual abrange direitos que protegem criações humanas, garantindo que autores e empresas sejam remunerados pelo uso de suas obras ou invenções. No Brasil, o tema é regulado principalmente por duas leis:
– Lei da Propriedade Industrial (1996): trata de patentes, marcas e desenhos industriais.
– Lei de Direitos Autorais (1998): protege obras culturais, como músicas, filmes e livros.
O artigo 71 da Lei de Propriedade Industrial permite que o governo quebre patentes em casos de interesse público ou emergência nacional. Um exemplo foi a quebra da patente do remédio Efavirenz, usado no tratamento do HIV, em 2007.

Segundo Fábio Pereira, sócio do escritório Veirano Advogados, o governo poderia usar esse mecanismo contra empresas estadunidenses.
“Em tese, o governo pode adotar esse tipo de medida em relação a medicamentos americanos, como uma resposta a Trump, mas uma possível consequência é a criação de distorções no mercado e a saída de investimento estrangeiro nessa área”, disse Pereira em entrevista ao G1.
Por outro lado, economistas destacam que essa estratégia evitaria pressões inflacionárias. “Se a resposta aos Estados Unidos for com tarifas de 50% sobre alimentos, o preço desses alimentos vai disparar no Brasil. Nesse sentido, a opção por mudanças em propriedade intelectual acaba parecendo mais segura”, afirmou Juliana Inhasz, professora de economia do Insper.
De acordo com a Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), os EUA são o segundo país com mais registros de patentes e marcas em 2024, atrás apenas da China. O Brasil aparece em sétimo em marcas, mas não está entre os 20 maiores em patentes.
Isso torna a propriedade intelectual um setor estratégico para os EUA e, portanto, um alvo sensível para retaliações.
Filmes, músicas e streaming entram na conta?
A Lei de Direitos Autorais protege produções culturais estrangeiras no Brasil, desde que haja acordos entre os países — como é o caso dos EUA. Por isso, seria difícil derrubar direitos autorais de filmes ou músicas.
“A lógica das patentes não vale para filmes e músicas, o governo não conseguiria derrubar o direito autoral sobre uma obra específica”, explicou Fábio Pereira.
No entanto, o Brasil poderia aumentar taxas sobre serviços culturais, como streaming, livros e filmes, mas isso elevaria custos para o consumidor brasileiro.
Trump anunciou a tarifa de 50% em carta pública ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para proteger o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de uma suposta perseguição jurídica em relação às investigações sobre a trama golpista, no qual é réu, responde em liberdade e tem direito a ampla defesa, conforme todo processo legal no Brasil.
Lula classificou a medida como “inadmissível” e afirmou que o Brasil recorrerá à Organização Mundial do Comércio (OMC), além de adotar retaliações econômicas proporcionais.
Na última segunda-feira (14), o petista assinou o decreto que regulamenta a Lei da Reciprocidade, aprovada pelo Congresso em abril deste ano. A medida estabelece o caminho legal para o Brasil adotar contramedidas comerciais e diplomáticas contra países que imponham barreiras unilaterais aos produtos brasileiros.