POLÍTICA

Era do Brasil vira-lata acabou, diz a revista mais prestigiada dos EUA

Homenagem a Trump em protesto em São Paulo

Em artigo publicado na presente edição da revista New Yorker, a mais prestigiada dos EUA, a jornalista Shannon Sims analisa os impactos políticos e simbólicos da ofensiva de Donald Trump contra o Brasil.

A colunista afirma que a tarifa de 50% imposta por Trump sobre produtos brasileiros representa mais do que uma medida econômica: é uma retaliação direta ao julgamento de Jair Bolsonaro e um teste à autoestima nacional. “Foi como um chute inesperado no estômago do país”, escreveu.

Sims relembra o episódio em que a primeira-dama Janja interrompeu uma jornalista durante coletiva no Itamaraty e ironizou: “Cadê meus vira-latas?”. A frase, segundo ela, expôs uma ferida antiga nas relações Brasil-EUA: o chamado complexo de vira-lata, termo cunhado por Nelson Rodrigues para descrever a sensação de inferioridade e a busca obsessiva por validação estrangeira.

O artigo destaca ainda o julgamento de Bolsonaro, acusado de planejar golpe, envenenar Lula e matar o ministro Alexandre de Moraes. Trump, por sua vez, tem pressionado publicamente pela suspensão do processo, dizendo em carta que se trata de uma “caça às bruxas”.

Enquanto isso, o ex-presidente brasileiro usa tornozeleira eletrônica e participa de atos públicos, como uma motociata. Seus aliados no Congresso chegaram a hastear uma bandeira MAGA, o que a autora descreve como a imagem mais pura do vira-latismo político.

Apesar do ataque comercial, Sims aponta que o Brasil parece estar superando o complexo. Lula tem usado a crise para reforçar o discurso de soberania — chegou a usar um boné azul com os dizeres “O Brasil é dos brasileiros”, em paródia ao slogan de Trump.

Diz ela:

Carl Jung, o psiquiatra suíço e fundador da psicologia analítica, é creditado pela teoria de que, assim como as pessoas podem ter complexos, os complexos também podem ter as pessoas. Segundo o pensamento junguiano, a maneira de superar um complexo inconsciente é tomar consciência dele. É isso que está começando a acontecer no Brasil. “O comportamento de Trump está unindo os brasileiros, algo que normalmente só acontece durante a Copa do Mundo”, disse Waldemar Magaldi Filho, fundador do Instituto Junguiano de Ensino e Pesquisa do Brasil. “Ele está, na verdade, nos colando uns aos outros por uma causa maior. Agora somos uma grande matilha de vira-latas.”

O erro de cálculo de Trump, ao agitar sua ameaça tarifária, é não perceber que os brasileiros estão hoje menos dispostos do que nunca a se curvar ao poder americano. Nos últimos anos, os brasileiros têm redescoberto sua autoconfiança. O país passou a explorar de forma extraordinária seu poder de influência por meio das redes sociais. Com uma população de 212 milhões de pessoas, os brasileiros usam redes sociais de forma intensa, passando, segundo relatos, muito mais tempo online por dia do que os usuários dos Estados Unidos. No ano passado, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, ordenou que a plataforma X removesse contas que espalhavam desinformação sobre as eleições presidenciais de 2022. Quando Elon Musk se recusou, o STF baniu o X no Brasil. Um mês depois, Musk recuou e aceitou pagar uma multa: perder mais de 20 milhões de usuários brasileiros de uma só vez talvez tenha sido um preço alto demais.

E, segundo pesquisa citada pela colunista, a resposta nacional tem sido de união e apoio às instituições. Como conclui um entrevistado brasileiro: “O vira-lata pode não morder, mas não será mais maltratado.”

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