
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pretende advertir Donald Trump, em uma esperada reunião bilateral, de que uma ofensiva militar dos Estados Unidos contra a Venezuela poderia ter consequências graves para toda a América Latina, ampliando a instabilidade e enfraquecendo governos democráticos da região. A informação foi publicada pela Folha de S.Paulo.
Segundo um alto funcionário do governo brasileiro, Lula levará a mensagem de que qualquer ataque contra o território venezuelano provocaria desordem regional e abriria espaço para o avanço do crime organizado e do tráfico de drogas. O presidente também argumentará que uma tentativa de “mudança de regime” — eufemismo tradicional do discurso de Washington para derrubar governos considerados incômodos — teria efeito contrário ao proclamado pelos EUA.
Intervenção americana reacende memórias de ingerência na região
Na última quarta-feira (15), Trump confirmou ter autorizado a CIA, agência de espionagem norte-americana com um histórico de golpes e interferências na América Latina, a realizar operações secretas na Venezuela com o objetivo de derrubar o governo de Nicolás Maduro.
Além disso, os EUA deslocaram navios de guerra para o mar do Caribe e mantêm pelo menos dez embarcações próximas à costa venezuelana, sob o pretexto de combater o “narcoterrorismo”.
O gesto reacende memórias do intervencionismo norte-americano que marcou o continente durante o século XX — do golpe de 1954 na Guatemala ao apoio à ditadura chilena em 1973. Para Brasília, esse tipo de ação representa uma ameaça direta à estabilidade regional e viola os princípios de soberania e autodeterminação dos povos, pilares da política externa defendida por Lula desde seus primeiros mandatos.
Diplomacia ativa e altiva
O governo brasileiro tem buscado evitar o contágio ideológico na relação bilateral com Washington. De acordo com integrantes do Planalto, o Brasil vem sendo bem-sucedido em “descontaminar” a pauta entre os dois países, afastando interferências da política interna.
A expectativa é que a reunião entre Lula e Trump ocorra ainda este ano, possivelmente à margem da reunião da ASEAN na Malásia (26 e 27 de outubro) ou da Cúpula das Américas, marcada para dezembro em Punta Cana, na República Dominicana.
Durante a conversa, o presidente brasileiro deve insistir na via diplomática como única alternativa legítima para a crise venezuelana. Em telefonema recente com Trump, Lula já havia destacado a importância de um “diálogo político” que preserve a soberania do país vizinho e evite o agravamento das tensões regionais.
Contexto regional e resistência ao bloqueio
O governo brasileiro também vê com reservas a realização da Cúpula das Américas, uma vez que, sob pressão de Washington, o governo dominicano decidiu não convidar Cuba, Venezuela e Nicarágua. O presidente colombiano Gustavo Petro já anunciou boicote ao evento em protesto contra a exclusão dos países latino-americanos.
Para o Itamaraty, essa postura dos EUA reafirma a política de isolamento e sanções que tem provocado impactos humanitários severos e resultados políticos nulos. Em vez de fortalecer a democracia, as medidas reforçam o discurso de resistência de Caracas e ampliam o sofrimento da população.
Embora a oposição venezuelana, representada por María Corina Machado, tenha ganhado visibilidade internacional ao ser laureada com o Prêmio Nobel da Paz, o governo brasileiro avalia que ela não possui representatividade real no país. Na leitura do Planalto, não há movimento político sólido capaz de substituir o chavismo-madurismo, consolidado há mais de duas décadas.
Com esse posicionamento, Lula reafirma o papel do Brasil como mediador da paz e defensor da autodeterminação dos povos, reforçando a tradição diplomática brasileira de rejeitar o uso da força e privilegiar o diálogo entre as nações. Com Brasil 247