
O Instituto Iter, fundado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), André Mendonça, faturou ao menos R$ 4,8 milhões em contratos com órgãos públicos em pouco mais de um ano de operação, segundo o levantamento do Estadão. O instituto oferece cursos, workshops e palestras a governos estaduais, prefeituras, tribunais de contas e assembleias legislativas — atividades nas quais o próprio Mendonça é a principal atração.
Criado em novembro de 2023, quando o ministro já ocupava cadeira no Supremo, o Iter passou de sociedade limitada (Ltda.) a sociedade anônima (S.A.) de capital fechado em 2024. O instituto é controlado indiretamente pelo casal Mendonça por meio da empresa Integre, também de sua propriedade.
Em nota, o Instituto Iter afirmou que atua “dentro dos parâmetros de mercado e da legalidade”, com “conformidade fiscal e jurídica em todas as parcerias”. O órgão argumenta que todas as atividades têm caráter educacional e técnico.
O ministro André Mendonça declarou que sua atuação é “exclusivamente acadêmica”, autorizada pela Lei Orgânica da Magistratura (Loman), e “plenamente compatível” com o exercício de suas funções no STF.
“O Iter é voltado à promoção do conhecimento técnico e científico, e todas as suas ações têm esse caráter”, diz a nota.
Contratos públicos e palestras com prefeitos
Segundo os dados obtidos pelo Estadão, mais de 50 contratos foram firmados desde maio de 2024 com entes públicos como os governos de São Paulo, Bahia e Piauí, as prefeituras de São Paulo e Recife, a Assembleia Legislativa do Paraná e Tribunais de Contas de ao menos sete estados.
O maior contrato — de R$ 1,2 milhão — foi assinado com o Consórcio Intermunicipal da Região Oeste Metropolitana de São Paulo, para capacitar servidores em “diversas áreas do direito e da administração pública”.
As palestras ministradas por Mendonça, com temas como “O prefeito do século XXI” e “A arte e a ciência da oratória jurídica”, representam mais de um terço do total de contratos firmados. O valor de uma vaga nesses cursos pode ultrapassar R$ 16 mil, chegando a R$ 29 mil em formações corporativas mais longas.
Redes de ex-auxiliares e ex-ministros bolsonaristas
O quadro societário do Iter inclui ex-integrantes do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e pessoas próximas a Mendonça desde sua atuação como advogado-geral da União e ministro da Justiça. Entre os sócios estão:
- Victor Godoy, ex-ministro da Educação e atual CEO do Iter;
- Danilo Dupas, ex-presidente do Inep;
- Tercio Tokano, ex-secretário-executivo do Ministério da Justiça;
- Rodrigo Hauer, atual chefe de gabinete de Mendonça no STF.
A esposa do ministro, Janey Mendonça, foi administradora do instituto até a transformação societária. Por meio da Integre, o casal continua como sócio majoritário.
Espaço de “diálogo neutro” e encontros com políticos
Mendonça afirma que o Iter tem o objetivo de “disseminar conhecimento e aproximar o setor público e privado”, funcionando também como ambiente de diálogo entre autoridades, “sem as influências de Brasília”.
Durante uma palestra em maio, o ministro revelou ter intermediado um encontro entre representantes da categoria médica e os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, Hugo Motta e Davi Alcolumbre, para tratar de projeto sobre exame de proficiência em medicina. Pouco depois da reunião, o texto passou a tramitar em regime de urgência na Câmara.
O instituto também assinou convênio com a Câmara Municipal de São Paulo, no qual a rubrica do próprio ministro aparece como testemunha, oferecendo descontos aos servidores públicos para cursos do Iter.
Revista Fórum



