
Em 18 de fevereiro, quando o procurador-geral apresentou a denúncia contra os responsáveis pela tentativa de golpe de Estado, manifestei-me diversas vezes – por conhecer o rito processual no Supremo Tribunal, onde advogo há longo tempo – que até setembro deveríamos ter o julgamento pela Primeira Turma. Desde então, venho acompanhando a instrução e, ao que tudo indica, agora em 13 de agosto serão apresentadas as alegações finais dos réus e o processo estará pronto para julgamento.
Como advogado criminal, posso imaginar o desespero dos réus ao começar a sentir o cheiro de cadeia. A certeza de que, em pouquíssimo tempo, estarão cumprindo penas altíssimas, maiores do que 30 anos, em estabelecimentos prisionais medievais. Papuda e Bangu já esperam a chegada dos prisioneiros ilustres. Nessa hora, é normal sentir medo, princípio de síndrome de pânico, raiva e desconfiança com tudo e todos.
No caso concreto, com a condenação certa de um líder de extrema direita, é bom observar as estratégias políticas dos seus liderados. Muitos começam a desaparecer, pois como dizia o velho Tancredo Neves, “na política a gente vai solidário até à beira da cova, acompanhando o caixão, mas não pula dentro com o defunto”. Outros, claramente, apostam no “quanto pior, melhor”. Não é só desespero, é um cálculo político.
Ainda que pareça teratológico, o grupo mais próximo do ex-presidente parece apostar numa prisão preventiva para tentar criar um fato novo. Sabem que, até final de setembro, Bolsonaro e seu bando estarão cumprindo pena definitiva em presídios desumanos. Ousam então, ainda que com o custo pessoal do próprio Bolsonaro, desafiar, aberta e reiteradamente, o Judiciário e o STF. Sob diversas formas, algumas com claro cometimento de outros delitos. É uma verdadeira guerra aberta.
E o método é atrevido: cometem, assumida e publicamente, até com certo orgulho, crimes de traição contra o país. Não é apenas obstrução de justiça. É um apelo claro para que os EUA invadam o Brasil, interfiram no Judiciário e pressionem o Supremo Tribunal. Ousadia jamais vista, pois a estratégia é divulgar os crimes por eles próprios cometidos. Concordam com as medidas tarifárias e com o uso ilegal, arbitrário e inconstitucional da lei Magnitsky contra membros do Judiciário brasileiro. São capachos e pistoleiros a soldo do Presidente Trump. E assumem. Os bolsonaristas vão às ruas com bandeiras norte-americanas e cartazes apoiando os EUA contra o Brasil.
Agora, forçaram uma prisão preventiva para tentar fazer uma jogada política, um fato novo. Na esperança de mudar o jogo. Criaram, deliberadamente, uma situação para conseguir uma prisão. O ministro Alexandre, prudente e cauteloso, determinou o uso de tornozeleira eletrônica. Deixou claro que existia motivo para uma preventiva, mas foi comedido. O que fazem Bolsonaro e seu bando? Descumprem as cautelares para forçar uma prisão preventiva. Parcimonioso, o ministro decreta uma domiciliar.

Juridicamente, não havia outra saída. O descumprimento de cautelares impostas pelo Supremo Tribunal tem, obrigatoriamente, consequências. Pode-se discutir o conteúdo, o alcance das primeiras cautelares. Isso é o dia a dia do processo criminal. Mas não se pode permitir, sob pena de desmoralizar o Judiciário, que meliantes afrontem uma decisão de um ministro do Supremo.
Há uma tensão no ar e o jogo está sendo jogado pelos mesmos atores. De um lado, a turma da ruptura institucional tentando ainda o golpe para fugir da responsabilidade criminal; de outro, os que, corajosamente, impediram o golpe contra a Democracia. E que estão novamente fazendo a resistência. Os golpistas mudaram a tática, mas estão vivos e ativos. Mais do que nunca, é imperioso apoiar o Judiciário e acompanhar as ações que levarão esses extremistas ao ostracismo do cárcere.
Lembrando-nos de Miguel Torga:
“Guarde a sua desgraça
Oh desgraçado.
Viva já sepultado
Noite e dia.
Sofra sem dizer nada,
Uma boa agonia
deve ser lenta, lúgubre e calada.”