
Em 9 de agosto de 2024, o voo 2283 da empresa aérea Voepass caiu em Vinhedo, interior de São Paulo (SP), resultando na morte das 62 pessoas a bordo. Agora, áudios inéditos divulgados revelam as últimas comunicações entre a tripulação da aeronave e o controle de tráfego aéreo de São Paulo. Esses registros, obtidos e cruzados com dados das caixas-pretas pelo g1, oferecem um olhar para os momentos derradeiros do voo.
Os áudios indicam uma comunicação aparentemente tranquila e dentro dos padrões operacionais para uma aproximação de pouso. Contudo, surpreendentemente, em nenhum momento os pilotos relatam qualquer pane ou situação de emergência. A troca de frequências, procedimento comum na aviação, ocorre conforme o avião atravessa diferentes setores do espaço aéreo. As últimas comunicações externas da tripulação, em uma terceira frequência, não constam nos áudios divulgados.
As investigações sobre o acidente, o mais grave da aviação brasileira em quase duas décadas, ganham novas camadas. Um depoimento exclusivo de um ex-funcionário da Voepass ao portal G1 trouxe à tona que, horas antes da decolagem fatal, o ATR 72-500 apresentou uma falha no sistema de degelo. Essa pane, que impossibilitaria a viagem para Cascavel, teria sido omitida do diário de bordo e ignorada pela liderança da manutenção.
A sequência de mensagens entre a aeronave e o controle de tráfego aéreo se inicia às 13h14min21s, com uma instrução para mudança de frequência. Após algumas trocas de rádio, incluindo a confirmação de recebimento do sinal pelo piloto, a tripulação avisa sobre o ponto ideal para iniciar a descida. Contudo, recebe a instrução para manter a altitude de 170 (5 mil metros).
Às 13h18min53s, o painel da aeronave indicou pela primeira vez um alerta de perda de velocidade, conforme dados da caixa-preta. Apesar disso, não há qualquer menção desse fato nas comunicações dos pilotos. Pouco depois, ocorre o último áudio disponível, com o controle instruindo nova mudança de frequência.
Aproximadamente 30 segundos após a última comunicação registrada, um alerta de segundo estágio, mais grave, de perda de velocidade, foi acionado na aeronave. O aviso do detector de gelo reapareceu no painel enquanto o comandante informava os passageiros sobre as condições do voo. Minutos depois, o sistema de degelo foi ativado pelos pilotos, evidenciando o reconhecimento do problema.
Além dos alertas internos, relatos de outros pilotos ao controle de tráfego aéreo de São Paulo indicaram formação de gelo na região momentos antes e após o acidente. Esses avisos de outras aeronaves reforçam a presença de condições meteorológicas adversas na área.
Carlos Eduardo Palhares, diretor do Instituto Nacional de Criminalística, destaca que os pilotos possuíam treinamento para voar em condições de gelo. A investigação busca compreender se os procedimentos foram seguidos e se decisões tomadas no momento ou condições prévias contribuíram para a tragédia. A Polícia Federal, em sua própria investigação, foca nas condutas de profissionais que possam ter influenciado o desfecho.
Especialistas e o Cenipa apontam que a formação de gelo pode ter sido um fator contribuinte, mas ressaltam que acidentes aeronáuticos raramente possuem uma única causa. O relatório preliminar do Cenipa cita a averiguação dos sistemas de degelo e a análise do desempenho técnico da tripulação como linhas de ação cruciais para a conclusão.
A aeronave, com 58 passageiros e quatro tripulantes, caiu no quintal de uma residência em um condomínio, felizmente sem deixar vítimas em solo. A Voepass, em nota, classificou a queda como o episódio mais difícil de sua história, reforçando a solidariedade às famílias das vítimas e afirmando que sempre operou com rigorosas exigências de segurança. A companhia colabora ativamente com as investigações em andamento.
Veja o vídeo com a descrição dos áudios: