
A famosa Times Square amanheceu diferente neste sábado (18/10). O que normalmente é território de turistas e personagens da Disney virou ponto de encontro de nova-iorquinos indignados com o governo de Donald Trump. No lugar dos super-heróis e princesas, surgiram fantasias de unicórnios, cartazes coloridos e famílias inteiras pedindo mais direitos e o fim do autoritarismo. Um deles dizia: “tenho orgulho do meu país, mas vergonha do meu governo”.
O protesto integra a série de marchas “No Kings”, organizadas em mais de 2.600 cidades dos Estados Unidos e também em capitais europeias. O nome “Sem reis” é uma referência à denúncia de que o presidente Trump tenta concentrar poderes de forma autoritária.
Antes das manifestações, os organizadores e grupos de defesa dos direitos humanos divulgaram nas redes sociais guias explicando os limites legais para protestar e orientações sobre como evitar confrontos com a polícia. A ideia era garantir que a mobilização ocorresse de forma pacífica, e o clima nas ruas refletia isso. Muitos cartazes traziam mensagens como “O amor vence” e “Unidos pela democracia”. A atmosfera lembrava uma prévia do Halloween: fantasias elaboradas, criatividade e famílias inteiras ocupando as ruas.
Entre as figuras que chamavam mais a atenção estava um homem vestido de unicórnio. “Os unicórnios são pacíficos e livres, tudo o que Trump não é”, explicou, sorrindo. “É uma forma de mostrar que queremos liberdade, não reis”, disse a Opera Mundi. Assim como ele, outros manifestantes utilizaram a estratégia iniciada por ativistas em Portland, no estado de Oregon, para protestar pacificamente em frente aos centros de detenção para imigrantes.
Um casal de jovens nova-iorquinas, que se identificaram como KJ, marchava com placas que diziam “as pessoas unidas podem derrotar os bilionários” e “Trump e Netanyahu são culpados pelo genocídio”. Elas explicaram que participam do movimento porque “estamos vendo mais injustiça do que conseguimos lidar diariamente”. Segundo uma delas, o diálogo com apoiadores do governo tem se tornado inútil: “tentamos conversar, mas nada avança. Então, quando a conversa não leva a lugar nenhum, a gente aparece em número, nas ruas”.
Para o casal, o movimento “No Kings” representa a rejeição a líderes autoritários. “Significa dizer não a ditadores”, afirmaram. “É manter a democracia viva, onde, se pessoas suficientes se levantam e dizem que não acreditam nesse governo, ele deve refletir isso. Em uma ditadura, isso não acontece.”

Diversas causas, um mesmo grito
As reivindicações eram variadas: respeito aos direitos civis, divulgação dos arquivos do caso Jeffrey Epstein — nos quais muitos acreditam que Trump seja citado —, fim das operações de deportação em massa, preservação da democracia e rejeição às medidas autoritárias do governo.
Entre as vozes mais exaltadas na Times Square estava Jen Smith, bombeira e reservista do Exército, que carregava um cartaz cobrando a divulgação dos arquivos de Epstein. “Eles não liberam os arquivos porque todos no Congresso e no Senado estão protegendo ele e seus amigos bilionários”, afirmou. “É óbvio — as fotos estão aqui, elas provam tudo”.
Para ela, o impasse político em Washington também é um dos motivos da revolta popular. “O governo está paralisado por culpa dos republicanos, que se recusam a empossar uma deputada eleita meses atrás, justamente o voto que falta para liberar os arquivos de Epstein”, disse. Jen contou que participa das marchas “No Kings” desde a primeira edição e que, a cada nova mobilização, o número de pessoas cresce.
A bombeira também demonstrou preocupação com o avanço das operações federais nas grandes cidades. “Ele está pagando até 175 mil dólares por ano para agentes do ICE, mais bônus de 50 mil, enquanto o governo está paralisado e veteranos e militares ficam sem receber”, criticou. “E ainda temos um homem bêbado comandando o Departamento de Defesa. Isso precisa parar de todos os lados”.
Apesar da indignação, Jen mantinha alguma esperança de que Nova York resistisse ao clima de tensão visto em Chicago, onde a Guarda Nacional foi enviada para conter protestos. “Somos muita gente aqui, e espero que isso nunca chegue à cidade, mas nunca se sabe”, disse, olhando em volta para as multidões que tomavam a Broadway.
Sobre o envio da Guarda Nacional a Chicago, a atriz Gabra Zachman, que levava um cartaz com a frase “ICE fede”, afirmou que “Trump está militarizando o país contra si mesmo”. Para ela, “é profundamente antiamericano usar forças federais para retirar cidadãos legais de suas casas e igrejas”.
Outros manifestantes compartilhavam o mesmo receio. “Tenho medo de que aconteça aqui o que está acontecendo em Chicago”, admitiu novamente Jen Smith, confiante de que “os nova-iorquinos vão resistir”, porque “essa cidade protege sua própria gente”.

Famílias e esperança
Muitos pais levaram os filhos, transformando a marcha em um ato geracional. “Minhas filhas precisam crescer em um país com mais direitos do que os meus pais tiveram”, disse Mitch Shrager, que caminhava com a filha de 13 anos. Para ele, Trump “quer ser um ditador” e está corroendo as instituições democráticas.
Apesar do clima de revolta, muitos manifestantes falavam com esperança sobre o futuro político do país. A atriz Gabra Zachman contou que, pela primeira vez, viu até a Fox News, tradicionalmente alinhada à direita, reconhecer que o comportamento do governo “é profundamente antiamericano”. “Isso me deu esperança”, disse. “Se até quem costuma apoiar Trump começa a enxergar o que está acontecendo, talvez mais gente levante a voz. Espero que isso gere mudança, primeiro em nível local, depois nas eleições. É assim que poderemos tirá-lo do cargo. É disso que precisamos: uma mudança de governo”.
A bombeira Jen Smith compartilhava o mesmo sentimento. Para ela, a força do movimento está no crescimento contínuo da mobilização popular. “Cada vez que voltamos às ruas somos mais e mais. Da última vez foram milhões, e agora é ainda maior. Ele está destruindo tudo em todas as frentes, mas as pessoas estão despertando”, afirmou.
O post Protestos ‘No Kings’ expõem rejeição a Trump e à política autoritária nos EUA apareceu primeiro em Opera Mundi.