
Em entrevista ao canal britânico The Spectator, o renomado cientista político americano John Mearsheimer, professor da Universidade de Chicago e um dos principais teóricos das relações internacionais, classificou o novo “plano de paz” de Donald Trump para Gaza — lançado em parceria com o premiê israelense Benjamin Netanyahu — como uma “proposta impossível de aceitar” e “um documento que legitima o genocídio em curso”.
O plano, de 20 pontos, prevê a criação de um “Conselho da Paz” que incluiria figuras como o ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair. Mearsheimer ironizou a composição do grupo e afirmou que o documento “é um plano israelense-americano, não uma proposta de paz”.
“O Hamas teria de ser insano para aceitar. O grupo seria obrigado a libertar todos os reféns em 72 horas, entregar suas armas e ver seus túneis destruídos — enquanto Israel manteria tropas dentro da Faixa de Gaza. Isso não é paz, é rendição”, declarou o professor.
O autor de “A Tragédia da Política das Grandes Potências” (2001) também afirmou que o plano ignora completamente o princípio de autodeterminação palestina. “Não há horizonte político, nem promessa de um Estado palestino. O que se propõe é uma ocupação prolongada sob outro nome”, avaliou.
“Continuação do genocídio”
Durante a conversa, Mearsheimer acusou Israel de praticar um genocídio em Gaza, citando relatórios de organizações como Anistia Internacional, Human Rights Watch e a israelense B’Tselem.
“Quase todas as grandes entidades de direitos humanos do mundo já classificaram o que está acontecendo como genocídio. Dizer que todas estão erradas seria um absurdo conspiratório. O que Israel faz é uma chacina sistemática — e o plano de Trump apenas institucionaliza isso”, disse.
O professor também comentou a exaustão visível de Trump, afirmando que o ex-presidente “parece desgastado” e “menos confiante” do que em seu primeiro mandato. Segundo Mearsheimer, o republicano “quer sinceramente encerrar as guerras da Ucrânia e de Gaza”, mas está “preso entre as pressões de Netanyahu e de um eleitorado americano cansado das aventuras militares”.
Plano com cheiro de oportunismo
O chamado “Acordo de Paz de Gaza” prevê uma retirada gradual de tropas israelenses, a supervisão americana sobre o território e o controle futuro por parte da Autoridade Palestina, treinada sob supervisão dos EUA e de Israel.
Mearsheimer chamou o plano de “tentativa cínica de reconstruir os Acordos de Abraão” — que, sob Trump, aproximaram Israel e alguns países árabes. “Trump quer um novo acordo com a Arábia Saudita e até fala em negociar com o Irã. Mas tudo isso é inviável enquanto Gaza continua em ruínas”, concluiu.
Um “homem de negócios, não de paz”
Apesar de dizer que Trump “não é um belicista” e “prefere acordos a guerras”, Mearsheimer afirmou que o ex-presidente age com a lógica de um empresário: “Ele quer fechar negócios, não construir justiça. Mas paz sem justiça é apenas uma pausa entre duas tragédias.”